terça-feira, 5 de julho de 2011

Cap. II

Meu pobre amigo, desculpe dizer aqui nossa história, sua história. Mas isso vem me abalando por anos que a cada vez que ando pelas calçadas da avenida paulista, ou cada vez que aperto com o meu dedo indicador o andar para aquele bar que fomos, no sesc, eu me lembro de você. E é uma recordação involuntária.
Não pense você que desejo todos os dias lembrar de como me olhava e fugia com os olhos para os prédios da avenida, me contando detalhes e nomes que você sabia que  eu desconhecia, só para rir da minha cara com um ar de desdém de quem entende mais sobre detalhes em cimentos do que eu. Não pense também que não entendo de detalhes. Me lembro de cada minuto na sua presença. O tapa na cara, esse eu não lembro, ou deveria lembrar, porque foi a última noite que passei com você, que já não fugia mais de mim com os seus olhos para detalhes em concreto. Fugia de mim como um homem. Fugia de mim com uma desculpa de um cigarro ou uma bebida que deixava seus olhos vermelhos. 
Vermelho de raiva, vermelho de cansaço, vermelho de loucura, mas nunca vermelho de lágrimas.
Meu pobre amigo, me desculpe dizer aqui nossa história. Mas acontece que isso vem me sufocando há exatamente 25 dias. Cada dia em cada passo em cada olhar. Cada dia em cada beijo que me toma, e não são seus lábios. Cada dia um cheiro que nunca é o seu, e confesso, não saberia identifica-lo pois a vontade de esquecer já não me deixa mais lembrar do que eu nunca tive. E nunca tive seu cheiro.
Dentre tantos que deitaram na minha cama, o suor escorrendo em sua testa na nossa primeira manhã (nunca tivemos noite, nunca) é o único cheiro que posso lembrar em você. E tantos, mas tantos, meu amigo, que abraçaram mais forte que você. Tantos me amaram mais profundamente que você. Perco as contas de tantos que me escreveram cartas, dedicaram poemas e músicas que você nunca teve o trabalho de pensar um dia em fazer para mim. Tantos me beijaram e me deram um prazer melhor que você.
Mas me perdoe o Chico Buarque, podem ser tantos, mas nenhum deles tinha aquela expressão que você, meu amigo, tinha.
De medo de dizer que tinha medo de me perder.
Meu pobre amigo, me desculpe dizer aqui nossa história. Mas é o único modo que vejo de conter minha angústia, de aquecer minha alma e alimentar minha esperança de que, quem sabe um dia, eu seja famosa, e vai que você me procura dizendo: porque você contou nossa história aqui?

2 comentários:

Iuri disse...

Gostei e muito

, disse...
Este comentário foi removido pelo autor.